quarta-feira, 27 de fevereiro de 2019

23 - O problema do espaço





O espaço é de vital importância para a movimentação dos seres, especialmente do homem. Experiências de laboratório demonstram que, em uma área circunscrita, na qual convivem bem alguns exemplares de ratos, à medida que aumenta o seu número, neles se manifesta a agressividade, até o momento em que, tornando-se mínimo o espaço para a movimentação, os roedores lutam, dominados por violenta ferocidade que os leva a dizimar-se.

Graças a isto, nas cidades e lugares outros superpopulosos, o respeito pela criatura e à propriedade desaparece, aumentando, progressivamente, a violência e o crime, que se dão as mãos, em explosões de sandices inimagináveis.

A diminuição do espaço retira a liberdade, restringindo-a, na razão do volume daqueles que o ocupam, o que dá margem à promiscuidade no relacionamento das pessoas, com o consequente desrespeito entre elas mesmas.

Inconscientemente, a preservação do espaço se torna um direito de propriedade, que adquire valores crescentes em relação à sua escassez e localização.

O homem, como qualquer outro animal, luta com todas as forças e por todos os meios para a manutenção da sua posse, a dominação do espaço adquirido e, às vezes, pelo que gostaria de possuir, tombando nas ambições desmedidas, na ganância.

No relacionamento social, cada indivíduo é cioso dos seus direitos, do seu espaço físico e mental, da sua integridade, da sua intimidade, zelando pela independência de ação e conduta nestas áreas comportamentais.

Quando os sentimentos afetivos irrompem e ele deseja repartir a sua liberdade com a pessoa amada, naturalmente espera compartir dos valores que ela possui, numa substituição automática daquilo que irá ceder.
Trata-se de uma concessão-recepção, gerando uma ação cooperativista.

A princípio, o encantamento ou a paixão substitui a razão, quebrando um hábito arraigado, sem chance de preenchê-lo por um novo, que exige um período de consciente adaptação para uma convivência agradável, emocionalmente retributiva.

Apesar disso, ficam determinados bolsões que não podem ou não devem ser violados, constituindo os remanescentes da liberdade de cada um, o reino inconquistado pelo alienígena.

Nos relacionamentos das pessoas imaturas, os espaços são, de imediato, tomados e preenchidos, tornando a convivência asfixiante, insuportável, logo passam as explosões do desejo ou os artifícios da novidade.

Surgem, nesse período, as discussões por motivos fúteis, que escamoteiam as causas reais, nascendo as mágoas e rancores que separam os indivíduos e, às vezes, os arruínam.

Nas afeições das pessoas amadurecidas psicologicamente, não há predominância de uma vontade sobre a do outro, porém, um bom entrosamento que sugere a eleição da sugestão melhor, sem que ocorra a governança de uma por outra vida, que a submetendo aos seus caprichos comprime-a, estimulando as reações de malquerença silenciosa que explodirá, intempestivamente, em luta calamitosa.

Por isto mesmo, o afeto conquista sem se impor, deixando livres os espaços emocionais, que substituem os físicos cedidos, ampliando-se os limites da confiança, que permite o trânsito tranquilo na sua e na área do ser amado, que lhe não obstaculiza o acesso, o que é, evidentemente, de natureza recíproca.

O homem ou a mulher de personalidade infantil deseja o espaço do outro, sem querer ceder aquele que acredita seu.

Quando consegue, limita a movimentação do afeto, a quem deseja subjugar por hábeis maneiras diversas, escondendo a insegurança que é responsável pela ambição atormentada.

Se não logra, parte para o jogo dos caprichos, que termina em incompatibilidade de temperamentos,
disfarçando as suas reações neuróticas.

A vida feliz é um dar, um incessante receber.

Toda doação gratifica, e nela, embutida, está a satisfação da oferta, que é uma forma de gratulação. Aquele que se recusa a distribuição padece a hipertrofia da emoção retribuída e experimenta carência, mesmo estando na posse do excesso.

Somente doa, cede, quem tem e é livre, interiormente amadurecido, realizado.

Assim, mesmo quando não recebe de volta e parece haver perdido o investimento, prossegue pleno, porquanto, somente se perde o que não se tem, que é a posse da usura e não o valor que pode ser multiplicado.

A pessoa se deve acostumar com o seu espaço, liberando-se da propriedade total sobre ele e adaptando-se, mentalmente, à ideia de reparti-lo com outrem, mantendo porém, integral, a sua liberdade íntima, cujos horizontes são ilimitados.

Ademais, deve considerar que os espaços físicos são transitórios, em razão da precariedade da própria vida material, que se interrompe com a morte, transferindo o ser para outra dimensão, na qual os limites tempo e espaço passam a ter outras significações.

segunda-feira, 2 de julho de 2018

Mecanismos de evasão


A larga infância psicológica das criaturas é dos mais graves problemas, na área do comportamento humano.

Habituada, a criança, a ter as suas necessidades e anseios resolvidos, imaturamente, pelos adultos — pais, educadores, familiares, amigos — ou atendidos pela violência do clã e da sociedade, nega-se a crescer, evitando as responsabilidades que enfrentará.

No primeiro caso, porque tudo lhe chega às mãos de forma fácil, dilata o período infantil, acreditando que a vida não passa de um joguete e o seu estágio egocêntrico deve permanecer, embora a mudança de identidade biológica, de que mal se dá conta.

Mimada, acomoda-se a exigir e ter, recusando-se o esforço bem dirigido para a construção de uma personalidade equilibrado, capaz de enfrentar os desafios da vida, que lhe chegam, a pouco e pouco.

Acreditando-se credora de todos os direitos, cria mecanismos inconscientes de evasão dos deveres, reagindo a eles pelas mais variadas como ridículas formas de atitude, nas quais demonstra a prevalência do período infantil.

No segundo caso, sentindo-se defraudada pelo que lhe foi oferecido com má vontade e azedume ou sistematicamente negado, a criança se transfere de uma para outra faixa etária, sem abandonar as sequelas da sua castração, buscando realizar os desejos sufocados, mas, vivos, quando lhe surja a oportunidade.

Em ambos acontecimentos, o desenvolvimento emocional  não corresponde ao físico e ao intelectual, que não são afetados pelos fenômenos psicológicos da imaturidade.

Excepcionalmente, pode suceder que o alargamento  do período infantil, por privação dos sentimentos e pelas angústias, produza  distúrbios na saúde física como na mental, gerando dilacerações profundas, difíceis de sanadas.

Na generalidade, porém, o que sucede  são as apresentações de adulto susceptível, medroso, instável, ciumento, que não superou a crise da infância, nela permanecendo sob conflitos lastimáveis.

As figuras domésticas representadas pelo  pai e pela mãe permanecem em atividade emocional, no inconsciente, resolvendo os problemas ou atemorizando o indivíduo, que se refugia em mecanismos   desculpistas  para não lutar, mantendo-se distante de tudo quanto possa gerar decisão, envolvimento responsável, enfrentamento.

Fugindo das situações que exigem  definição, parte para as formulações e comportamentos parasitas, buscando nas pessoas que considera fortes e são elegidas como seus heróis ou seus superiores, porquanto, tudo que elas empreendem se apresenta coroado de êxito.

Não se dá conta da luta que travam,  das renúncias e sacrifícios que se impõem.

Esta parte, não lhe interessa, ficando propositadamente ignorada.

Como efeito cresce-lhe  a área dos conflitos da personalidade, com predominância da autocompaixão, num esforço egoísta de receber carinho e assistência, sem a consciência da necessidade de retribuição.

Não lhe amadurecendo os  sentimentos da solidariedade e do dever, crê-se merecedor de tudo, em  detrimento do esforço de ser útil ao próximo e à comunidade, esquecendo-se das falsas necessidades para tornar-se elemento de produção em favor do bem geral.

Instável emocionalmente, ama como fuga, buscando apoio, e transfere para a pessoa querida as responsabilidades e preocupações que lhe são pertinentes, tornando o vínculo afetivo insuportável para o eleito.

Outras vezes, a  imaturidade psicológica reage pela forma de violência, de agressividade, decorrentes dos caprichos infantis que a vida, no relacionamento social, não pode atender.

Uma peculiar insensibilidade emocional domina o indivíduo, que se desloca, por evasão psicológica, do ambiente e das pessoas com quem convive, poupando-se a  aflições e somente considerando os próprios problemas, que o comovem, ante a  frieza que exterioriza quando em relação aos sofrimentos do próximo.

O homem nasceu  para a auto-realização, e faz parte do grupo social no qual se  encontra, a fim de promovê-lo crescendo com ele. Os problemas devem constituir-lhe meio de desenvolvimento, em razão de serem-lhe estímulos desafios, sem os quais o tédio se lhe instalaria nos painéis da atividade, desmotivando-o para a luta.

Desse modo, são parte integrante da estruturação mental e emocional,

responsáveis  pelos esforços do próximo e do grupo em conjunto, para a sobrevivência de todos. O solitário é prejuízo e dano na economia social, perturbando a coletividade.

Fatores que precedem ao berço, presentes na historiografia do homem, decorrentes das suas existências anteriores, situam-no, no curso dos renascimentos, em lares e junto aos pais de quem necessita, a fim de superar as dívidas, desenvolver os recursos que lhe são inerentes e lhe estão adormecidos, dando campo à fraternidade que deve viger em todos os seus atos.

Assim,  cumpre-lhe libertar-se da infância psicológica, mediante as terapias competentes, que o desalgemam dos condicionamentos perniciosos, ao mesmo tempo trabalhando-lhe a vontade, para assumir as responsabilidades que fazem parte de cada período do desenvolvimento físico e intelectual da vida.

Partindo de decisões mais simples, o exercício de ações responsáveis, nas quais o insucesso faz parte dos empreendimentos, o homem deve evitar os mecanismos de evasão, assim como as justificativas sem sentido, tais: não tenho culpa, não estou acostumado, nada comigo dá certo, aí ocultando a sua realidade de  aprendiz, para evitar as outras tentativas que certamente se farão coroar de êxitos.

A  experiência do triunfo é lograda através de sucessivos eitos.

O acerto, nos primeiros tentames, não significa a segurança de continuados resultados positivos.

Em todas as áreas do comportamento estão presentes a glória e o fracasso, como expressões do mesmo empreendimento.

A fixação de qualquer  aprendizagem dá-se mediante as tentativas frustradas ou não. Assim, vencer o desafio é esforco que resulta da perseverança, da repetição, sem enfado nem cansaço.

Toda fuga psicológica contribui para a manutenção do medo da realidade, não levando a lugar algum. Mediante sua usança, aumentam  os receios de luta, complicam-se os mecanismos de subestima pessoal e desconsideração  pelos próprios  valores.

O homem, no entanto, possui recursos inesgotáveis que estão ao alcance do esforço pessoal.

Aquele que se demora somente na contemplação do que deve fazer, porém, não se anima a realizá-lo, perde excelente oportunidade  de desvendar-se, desenvolvendo as capacidades adormecidas que o podem brindar com segurança e realização interior.

Todo o esforço a ser envidado,  em favor da libertação dos mecanismos de fuga, contribui para apressar  o equilíbrio emocional, o amadurecimento psicológico, de modo a assumir a sua humanidade, que é a característica definidora do indivíduo: sua memória, seus valores, seus atos, seu pensamento.

A fuga, portanto, consciente ou não, no comportamento  psicológico, deve ser abolida, por incondizente com a lei do progresso, sob a qual todas as pessoas se encontram submetidas pela fatalidade da evolução.

sábado, 12 de maio de 2018

O homem moderno


Buscando enganar a sua realidade mediante a própria fan­tasia, o homem moderno procura a projeção da imagem sem o apoio da consciência. Evita a reflexão esclarecedora, que pode desalgemar dos problemas, e permanece em contínuas tentativas de negar-se, mascarando a sua individualidade. O ego exerce predominância no seu comportamento e estereo­tipa fantasias que projeta no espelho da imaginação.

Irrealizado, porque fugindo do enfrentamento com o seu eu, transfere-se de aspirações e cuidados a cada novidade que depara pelo caminho. Não dispõe de decisão para desmasca­rar o ego, por temer petrificar-se de horror, qual se aquele fosse uma nova Medusa, que Perseu, e apenas ele, venceu, somente porque a fez contemplar-se no escudo espelhado que lhe dera Atena…

Obviamente, esse espelho representa a consciência lúci­da, que descobre e separa objetivamente o que é real daquilo que apenas parece. Nesse sentido, o ego que vive e reincide nos conteúdos inconscientes, necessita de conscientizar-se, desidentificando-se dos seus resíduos emergentes.

O homem vive na área das percepções concretas e, ao mesmo tempo, das abstratas.

A cultura da arte faz que ele se porte, ora como observa­dor, ora como observado e ainda o observador que se observa, a fim de poder transformar os complexos ou conflitos inconscientes em conhecimentos que possa conduzir, senhor da sua realidade, dos seus atos.

Sua meta é poder sair da agitação, na qual se desgoverna, para observar-se, a distância, evitando o sofrimento macerador.

A este ato chamaremos a separação necessária entre o sujeito e o objeto, através da qual se observam os aconteci­mentos sem os sofrer de forma dilacerante, modificando o estado de ânimo angustiante para uma simples expressão do conhecimento, mediante a transferência da realidade que jaz no espírito para o exterior das formas e da emoção.

A reflexão constitui um admirável instrumento para o lo­gro, apoiando-se na cultura e na realização artística, social, solidária, que desvela os mananciais de sentimento e de cons­ciência humanos.

Jogado em um mundo exterior agressivo, no qual predo­minam a luta pela sobrevivência do corpo e a manutenção do status, o homem acumula conteúdos psíquicos não descartá­veis nem digeríveis, avançando, apressado, para o stress, as neuroses, as alienações.

Acumula coisas e valores que não pode usar e teme per­der, ampliando o campo do querer, mais pelo receio de pos­suir de forma insuficiente, sem dar-se conta da necessidade de viver bem consigo mesmo, com a família e os amigos, participando das maravilhosas concessões da vida que lhe estão ao alcance.

A mensagem de Jesus é uma oportuna advertência para essa busca insana, quando Ele recomenda que “não se ande, pois, ansioso pelo dia de amanhã, porque o dia de amanhã a si mesmo trará seu cuidado; ao dia bastam os seus próprios males.”(*)

(*) Mateus: capítulo 6, versículo 34 – Nota da Autora espiritual.

Comedir-se, agir com sensatez e tranqüilidade, confiar nos próprios valores e nas possibilidades latentes são regras que vão ficando esquecidas, a prejuízo da harmonia pessoal dos indivíduos.

Os interesses competitivos postos em jogo, a aflição por vencer os outros, o sobrepor-se às demais pessoas desarticu­laram as propostas da vitória do homem sobre si mesmo, da sua realização interior, da sua harmonia diante dos proble­mas que enfrenta. As linhas do comportamento alteradas, in­duzindo ao exterior, devem agora ser revisadas, sugerindo a conduta para o conhecimento dos valores reais, a redescober­ta do sentido ético da existência, a busca da sua imortalidade.

Quando o homem moderno passar a considerar a própria imortalidade em face da experiência fugaz do soma, empre­enderá a viagem plenificadora de trabalhar pelos projetos du­radouros em detrimento das ilusões temporárias, observando o futuro e vivendo-o desde já, empenhado no programa da sua conscientização espiritual. Nele se insculpirá , então, o modelo da realização em um ser integral, destituído do medo da vida e da morte, da sombra e da luz, do transitório e do permanente, da aparência e da realidade.

sábado, 5 de maio de 2018

A tragédia do cotidiano


Os conteúdos psicológicos do homem hodierno são de aturdimento, instabilidade emocional, insegurança pessoal, levando-o à perda do senso trágico.

Desestruturados pelos choques comportamentais e esma­gados pelo volume das informações impossíveis de serem digeridas, as massas eliminam arquétipos ou os transferem para indivíduos imaturos portadores de fragilidade psicoló­gica, aterrando-os, soterrando-os, na avalanche das necessi­dades mescladas com os conflitos existenciais.

Simultaneamente, desaparecem os mitos ancestrais indi­viduais e a cultura devoradora investe contra os outros, os coletivos, deixando as criaturas desprotegidas das suas cren­ças, dos seus apoios psicológicos.

A fé cega substituída pela ditadura da razão, destruiu ou substituiu os mitos nos quais se sustentavam os homens, apre­sentando outros, igualmente frágeis, que novamente sofrem a agressão dos valores contemporâneos.

A consciência coletiva, herdeira do choque dos opostos, do ser e do não ser, da coragem e do medo, do homem e da mulher, não sobrevive sem a segurança mítica.

Os seus arquétipos, multimilenarmente estruturados na convicção mitológica, alternam a forma de sobrevivência, transferindo-se os mitos deificados, porém sobreviventes, na sua profundidade psicológica, a todos os golpes mortais que lhe foram desferidos através dos tempos.

Ressuscitam, não obstante, disfarçados em novos mode­los, porém, ainda dominadores, prometendo glórias e casti­gos, prazeres e frustrações aos seus apaniguados, conforme o culto que deles recebam.

Assim, ao lado da violência que se espraia dominadora, vicejam religiões apressadas, salvadoras, na sua ingenuidade mítica, arrastando multidões desprevenidas e sem esclareci­mento que, fracassadas, no contubérnio social, ali se refugi­am, cultuando o paraíso eterno que lhes está reservado como prêmio ao sofrimento e ao desprezo de que se sentem objeto pela cultura consumista e desalmada.

A auto-realização pelo fanatismo mantém os bolsões da miséria sócioeconômica, por não trabalhar o idealismo laten­te no homem, a fim de que transforme os processos gerado­res da desgraça atual em realização pessoal e felicidade, na Terra, mesmo.

De certa maneira, o arrebanhar das multidões para as cren­ças salvadoras diminui, de alguma forma, o volume da vio­lência, que irrompe, paralelamente, porqüanto, sem o mito da salvação pela fé, toda essa potencialidade seria canaliza­da na direção da agressividade destruidora.

A agressividade salvacionista a que dá lugar, embora os prejuízos éticos e sociais que engendra, acalma os conteúdos psicológicos desviando os sujeitos dos crimes que poderiam cometer.

O mito da violência, por sua vez, nascido nos porões do submundo da miséria sócioeconômico-moral e graças à eclo­são das drogas em uso abusivo, engendra o símbolo da força, do poder, do estrelismo, no campeonato da aventura e da bra­vata, exibindo as heranças atávicas da animalidade primitiva ainda predominante no homem.

Toma-se pela força o que deveria ser dado pela fraterni­dade, através do equilíbrio da justiça social e dos deveres humanos, em solidário empenho pela promoção dos indiví­duos, dignos de todos os direitos à vida que apenas alguns desfrutam.

A tragédia do cotidiano se apresenta nas mil faces da vi­olência que se mescla ao comportamento geral, muitas vezes disfarçando-se até em formas de submissão rebelde e humildade-humilhante, que descarregam suas frustrações adquiri­das ao lado dos mais fortes, no dorso desprotegido dos mais fracos.

Os conteúdos psicológicos, mantenedores do equilíbrio, fragmentam-se ao choque do cotidiano agitado e desestrutu­ram o homem que se asselvaja, ou foge para a furna sombria da alienação, considerando-se incapaz de enfrentar a convi­vência difícil do grupo social, igualmente superficial, inte­resseiro, despreparado para a conjuntura vigente.

Graças a isso, os indivíduos fracassam ou enfermam, atri­tam ou debandam enquanto os crédulos ressuscitam os mitos das velhas crendices de males feitos, de perseguições da in­veja, do ciúme e do despeito, ou arregimentam argumentos destituídos de lógica para explicarem as ocorrências malsu­cedidas, danosas…

Certamente, sucedem tais perseguições; busca-se o mal­fazer; campeiam as paixões inferiores que são pertinentes ao homem, ainda em estágio infantil da sua evolução, sem que seja mau.

A sua aparente maldade resulta dos instintos agressivos ainda não superados, que lhe predominam em a natureza ani­mal, em detrimento da sua natureza espiritual.

Em toda e qualquer tragédia do cotidiano, ressaltam os componentes psicológicos encarregados da desestruturação do homem, nesse processo de individuação para adquirir uma consciência equilibrada, capaz de proporcionar-lhe paz, saú­de, realização interior, gerando, no grupo social, o equilíbrio entre os contrários e a satisfação real da convivência não com­petitiva, no entanto cooperativa.

sexta-feira, 6 de abril de 2018

Doenças físicas e mentais


A expressiva soma de atividades físicas e mentais atesta que o homem é um ser inacabado. A sua estrutura orgânica aprimorada nos milênios da evolução antropológica, ainda padece a fragilidade dos elementos que a constituem.

Vulnerável a transformações degenerativas, é tecido que reveste o psiquismo e que através dos seus neurônios cere­brais se exterioriza, afirmando-lhe a preexistência conscien­cial, independente das moléculas que constituem a aparelha­gem material.

A consciência, na sua realidade, é fator extrafísico, não produzido pelo cérebro, pois que possui os elementos que se consubstanciam na forma que lhe torna necessária à exterio­rização.

Essa energia pensante, preexistente e sobrevivente ao cor­po, evolve através das experiências reencarnacionistas, que lhe constituem processo de aquisição de conhecimentos e sentimentos, até lograr a sabedoria. Como conseqüência, faz-se herdeira de si mesma, utilizando-se dos recursos que ame­alha e deve investir para mais avançados logros, etapa a eta­pa.

Em razão disso, podemos repetir que somente “há doen­ças, porque há doentes”, isto é, a doença é um efeito de dis­túrbios profundos no campo da energia pensante ou Espírito.

As suas resistências ou carências orgânicas resultam dos processos da organização molecular dos equipamentos de que se serve, produzidos pela ação da necessidade pensante.

O psicossoma organiza o soma necessário à viagem, bre­ve no tempo, para a individualidade espiritual.

As doenças orgânicas se instalam em decorrência das ne­cessidades cármicas que lhe são inerentes, convocando o ser a reflexões e reformulações morais proporcionadoras do ree­quilíbrio.

Nas patologias congênitas, o psicossoma impõe os fato­res cármicos modeladores necessários à evolução, sob impo­sitivos que impedem, pelos limites de injunções difíceis, a reincidência no fracasso moral.

Assim considerando, à medida que a Ciência se equipa e soluciona patologias graves, criando terapias preventivas e proporcionando recursos curativos de valor, surgem novas doenças, que passam a constituir-se tremendos desafios. Isto se dá, porque, à evolução tecnológica e científica da socieda­de não se apresenta, em igual correspondência, o mecanismo de conquistas morais.

O homem conquista o exterior e perde-se interiormente. Avança na horizontal do progresso técnico sem o logro da vertical ética. No inevitável conflito que se estabelece — co­modidade e prazer, sem harmonia interna nem plenitude —desconecta os centros de equilíbrio e abre-se favoravelmente a agentes agressores novos, aos quais dá vida e que lhe de­sorganizam os arquipélagos celulares.

Outrossim, as tensões, frustrações, vícios, ansiedades, fobias facultam as distonias psíquicas que são somatizadas aos problemas orgânicos ou estes e suas sequelas dão surgi­mento aos tormentos mentais e emocionais.

Todo equipamento para funcionar em harmonia com ajustamento, para as finalidades a que se destina, exige per­feita eficiência de todas as peças que o compõem.

Da mesma forma, a maquinaria orgânica depende dos flu­xos e refluxos da energia psíquica e esta, por sua vez, das respostas das diversas peças que aciona. Nessa interdepen­dência, a vibração mental do homem é-lhe propiciadora de equilíbrio ou distonia, conscientemente ou não.

Sabendo ca­nalizar-lhe a corrente vibratória, organiza e submete os im­plementos físicos ao seu comando, produzindo efeitos de saú­de, por largo período, não indefinidamente, face à precariedade dos elementos construídos para o uso transitório.

As doenças contemporâneas, substituindo algumas anti­gas e somando-se a outras não debeladas ainda, enquadram-se no esquema do comportamento evolutivo do ser, no seu processo de harmonização interior, de deificação.

Na sua essência, a energia pensante possui os recursos divinos que deve exteriorizar. Para tanto, à semelhança de uma semente, somente quando submetida à germinação fa­culta a eclosão dos seus extraordinários elementos, até então adormecidos ou mortos. A morte da forma desata-lhe a vida latente.

A mente equilibrada comandará o corpo em harmonia e, nesse intercâmbio, surgirá a saúde ideal.

quinta-feira, 1 de março de 2018

Os comportamentos neuróticos


Produtos do inconsciente profundo, a se manifestarem como comportamentos neuróticos, os fatores psicogênicos têm suas raízes na conduta do próprio paciente em reencarnações passadas, nas quais se desarmonizou interiormente. Fosse mediante conflitos de consciência ou resultados de ações ig­nóbeis, os mecanismos propiciadores de reabilitação íntima imprimem no inconsciente atual as matrizes que se exteriori­zam como dissociações e fragmentações da personalidade, alucinações, neuroses e psicoses.

Ínsitas no indivíduo, essas causas endógenas se associam às outras, de natureza exógena, tornando-se desagregadoras da individualidade vitimada pelas pressões que experimenta.

As pressões de qualquer natureza são decisivas para esta­belecer o clima comportamental da criatura.

Por formação antropológica, em luta renhida contra os fatores compressivos e adversários, o homem aspira pela liberdade. Todos os seus esforços convergem para uma atitu­de, uma atuação, um movimento, livres de empeços, de de­tenções, de aprisionamento.

As pressões que lhe limitam os espaços emocionais e fí­sicos aturdem-no, dando margem a evasões, agressividade, disfarces e violências, através dos quais tenta escamotear o seu estado real. Isto, quando não tomba na depressão, no pes­simismo.

Vivendo sob estímulos, faculta-os à sociedade, que pro­gride e age conforme as energias que os constituem.

Quando estes estímulos são emuladores à felicidade, eis o homem atuante e encorajado, trabalhando pelo progresso próprio e geral, mediante um comportamento otimista. No sentido oposto, quase nunca se motiva à reação, para ascen­der aos sentimentos ideais que promovem a vida, libertando-se das constrições naturalmente transitórias.

Equivocado quanto aos referenciais da existência, deixa-se imbuir pelas sensações da posse, do prazer fugidio, caindo em depressões, seja pela constituição psicológica fragmentá­ria ou porque estabelece como condição de triunfo a aquisi­ção das coisas que se podem amealhar e perdem o valor, quan­do se não possui o essencial, que é a capacidade de adminis­trá-las, não se lhes submetendo ao jugo enganoso.

Assim, apresentam-se os que se crêem infelizes porque não têm e os que se fazem desditosos porque tendo, não se contentam face à ausência da plenitude interior.

O mito da ambição do rei Midas, que tudo quanto tocava se convertia em ouro, causa da sua felicidade e desgraça, tem atualidade no comportamento neurótico dos possuidores-pos­suídos.

A experiência, no entanto, fazendo a pessoa aprofundar-se na consciência dos valores, altera-lhe o campo de compre­ensão, favorecendo o entesouramento do equilíbrio. Todavia, tal ocorrência é resultado da luta que deve ser travada sem cessar.

Assim, a saúde psicológica decorre da autoconsciência, da libertação íntima e da visão correta que se deve manter a respeito da vida, das suas necessidades éticas, emocionais e humanas.

O comportamento neurótico, assustador e predominante na sociedade consumista, procura esconder o desajuste e as fobias do homem contemporâneo, que se afunda em meca­nismos patológicos.

Receando ser ele mesmo, torna-se pessoa-espelho a re­fletir as conveniências dos outros, ou homem-parede a reagir contra todas as vibrações que lhe são dirigidas, antes de as examinar.

“Agredir antes, evitando ser agredido” é a filosotia dos fracos, fechando-se no círculo apertado dos receios e da não aceitação dos outros, forma neurótica de ocultar a não aceita­ção de si mesmo.

São raros aqueles que preferem ser homens-pontes, colo­cados entre extremos para ajudarem, facilitarem o trânsito, socorrerem nos abismos existenciais...

O espírito de competição neurotizante vigente e estabele­cido como fomentador das riquezas, deve ceder lugar ao de cooperação, responsável pela solidariedade e pela paz, hu­manizando a sociedade e tornando a pessoa bem identifica­da.

Competir não é negativo, desde que tenha por meta pro­gredir, e não vencer os outros; porém, superar-se cada vez mais, desenvolvendo capacidades latentes e novas na indivi­dualidade.

Competir, todavia, para derrubar quem está à frente, em cima, é atitude neurótica, inconformista, invejosa, que abre brecha àquele que vem atrás e repetirá a façanha em relação ao aparente vencedor atual. Tal atitude responde pela insegurança que domina em todas as áreas do relacionamen­to social.

Da mesma forma, deixar-se viver sem aventurar-se, no bom sentido do termo, como se transitasse em um sonho cu­jos acontecimentos inevitáveis se dão sem qualquer ingerên­cia da pessoa, é uma atitude patológica, irracional, em se con­siderando a capacidade de discernimento e a de realização que caracteriza a criatura humana.

O homem-ação de equilíbrio gera os fatores do próprio desenvolvimento, abandonando o conformismo neurótico, a fim de comandar o destino sempre maleável a injunções no­vas e motivadoras.

Os seres humanos têm as suas matrizes em a natureza, com a qual devem manter um relacionamento saudável, ao invés de evitá-la. Sendo partes integrantes da mesma, não se devem alienar, antes buscar-lhe a cooperação e auxiliá-la num intercâmbio de energias vigorosas, com o que sairão da gaio­la particular onde se ocultam e se acautelam.

Há personalidades neuróticas que a temem, receosas de serem absorvidas pela sua grandiosidade e dando às suas ex­pressões — céus, montanhas, mares, florestas, etc. — determi­nados tipos de projeções humanas, poderosas e devoradoras. Assim, anulam-na, matando-a no seu consciente através da negação da sua necessidade.

Os comportamentos neuróticos são desgastantes, extra­polando os limites das resistências orgânicas, que passam a somatizá-los, abrindo campo para várias enfermidades que poderiam ser evitadas.

segunda-feira, 23 de outubro de 2017

O conceito de saúde

Lexicamente, “saúde é o estado do que é são, do que tem as funções orgânicas regulares.”
A Organização Mundial de Saúde elucida que a falta de doença não significa necessariamente um estado de saúde, antes, porém, esta resulta da harmonia de três fatores essen­ciais, a saber: bem-estar psicológico, equilíbrio orgânico e satisfação econômica, assim contribuindo para uma situação saudável do indivíduo.
Num período de transição e mudança brusca da escala dos valores convencionais, com a inevitável irrupção dos excessos geradores da anarquia, a saúde tende a ceder espaço a conflitos emocionais, desordens orgânicas e dificuldades econômicas, propiciando o surgimento de patologias com­plexas no homem.
A sociedade enferma perturba-o, e este, desajustado, pio­ra o estado geral do grupo.
O sentido de dignidade pessoal, nesta situação, é substi­tuído pela astúcia e pelo prazer, proporcionando distonias emocionais que facultam a instalação de enfermidades orgâ­nicas de variada procedência.
Abstraindo-se destas últimas, aquelas que são originadas por germes, bacilos, vírus e traumatismos, multiplicam-se as de ordem psicológica, que se avolumam nos dias atuais.
O homem teima por ignorar-se. Assume atitudes contra­ditórias, vivendo comportamentos estranhos. Prefere deixar que os acontecimentos tenham curso, às vezes, desastroso, a conduzi-los de forma consciente.
Os dias se sucedem, sem que ele dê-se conta das suas responsabilidades ou frua dos seus benefícios em uma atitu­de lúcida, perfeitamente compatível com as conquistas con­temporâneas.
Surpreendido, no entanto, pela doença e pela morte, des­perta assustado, sem haver vivido, estranhando-se a si mes­mo e descobrindo tardiamente que não se conhecia. Foi um estranho, durante toda a existência, inclusive, a ele próprio.
A saúde, entretanto, fá-lo participativo, membro atuante do grupo social, desperto e responsável na luta com que se enriquece de beleza e alegria, assumindo posições de vigor e segurança íntima, que lhe constituem prêmio ao esforço de­senvolvido.
A falta de saúde, que se generaliza, conduz a mente lúci­da a um diagnóstico pessimista, o que não significa ser de­sesperador.
Em tal situação, por falta de outra alternativa, o homem enfrenta a dificuldade, por ser pensante, e altera o quadro, impulsionado ao avanço, a aceitar os desafios.
Deixa de fugir da sua realidade, descobre-se e trabalha para alcançar etapas mais lúcidas no seu desenvolvimento emocional, pessoal.
Quem se resolve, porém, pela submissão autodestrutiva, não merece o envolvimento respeitoso de que todos são cre­dores diante dos combatentes, porqüanto, deixando de inves­tir esforços, abandona a sua dignidade de ser humano e pre­fere o esfacelamento das suas possibilidades como sendo o seu agradável estado de saúde, certamente patológico.
A saúde produz para o bem e para o progresso da socie­dade, sem compaixão pelos mecanismos de evasão e pieguis­mos comportamentais vigentes.
Realizadora, propele a vida para as suas cumeadas e vitó­rias, sem parada nas baixadas desanimadoras.